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<meta name="description" content="Uma reflexão da ontologia do ser social para uma sociedade mais justa e livre. Leia sobre a miséria da ontologia e o papel do trabalho na transformação do Macaco em Gente.">
<meta property="og:title" content="A Miséria da Ontologia">
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<title>A Miséria da Ontologia</title>
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A miséria
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da Ontologia
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ou
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O papel do Trabalho na transformação do Macaco em Gente
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<section>
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Ser é movimento. Todas as coisas que se manifestam no plano da existência de alguma forma estão fluindo. Até mesmo o que à primeira vista parece estático, se mexe. Até aqui, nada de novo para o pensamento moderno, clássico e pretérito. Afinal, até mesmo o velho Heráclito há muito tempo já fundamentava sua filosofia em uma base bastante fluida (mais que fluída, aquática se lembrarmos a história da mesma pessoa não tomar banho no mesmo rio). Ser é movimento, isto está posto. Mas qual é a essência desse movimento? Em quais condições particulares ele ocorre?
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Quem parece ter dado um passo adiante na busca por essa resposta, foi Hegel ao perceber que este movimento é impulsionado por contradições que estão presentes no próprio ser. Esta contradição gera tensionamentos que podem aumentar e no limite dessa tensão entre as contradições contidas no ser, acontecem rupturas e através dessas rupturas ocorrem transformações. Em Hegel esse movimento dialético é do espírito, criado pelo pensamento.
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<img alt="" src="https://github.com/hericmr/miseria_da_ontologia/blob/main/Hegel%20reading%20Heraclitus.jpg?raw=true" />
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Hegel lendo Heráclito por Stephen Lahey 2021
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Depois Marx recuperou essa ideia e desenvolveu a concepção de movimento gerado pelas contradições para além de uma “camada espiritual” ou Ideal hegeliana. O movimento do ser em Marx, atravessa toda a realidade material chegando até mesmo na subjetividade dos seres humanos. Um movimento do material para o ideal, o oposto do que Hegel propôs. Em sua Crítica da Filosofia do Direito de Hegel, em um debate com a ideia sobre as noções de como deve ser a crítica à religião, Marx demonstra que a religião por ser criada pelos humanos, tem suas origens concretas primeiro, e organiza-se nas consciências depois.
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“Este é o fundamento da crítica irreligiosa: o homem faz a religião, a religião não faz o homem. E a religião é de fato a autoconsciência e o auto sentimento do homem, que ou ainda não conquistou a si mesmo ou já se perdeu novamente. Mas o homem não é um ser abstrato, acocorado fora do mundo. O homem é o mundo do homem, o Estado, a sociedade. Esse Estado e essa sociedade produzem a religião, uma consciência invertida do mundo, porque eles são um mundo invertido. A religião é a teoria geral deste mundo, seu compêndio enciclopédico, sua lógica em forma popular, seu point d'honneur espiritualista, seu entusiasmo, sua sanção moral, seu complemento solene, sua base geral de consolação e de justificação. Ela é a realização fantástica da essência humana, porque a essência humana não possui uma realidade verdadeira. Por conseguinte, a luta contra a religião é, indiretamente, contra aquele mundo cujo aroma espiritual é a religião.” [MARX, 1964, p. 48]
</p>
<img alt="Tank" src="https://i.redd.it/e015zuet6w461.jpg" />
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Há um processo gerando o mundo e gerando também um mundo de ideias, nossa subjetividade tem origens ontológicas nada subjetivas. As flores da consciência humana tem raízes que emergem da lama de algum quintal bem material. Sendo assim qualquer reivindicação de conhecimento precisa ter um pressuposto ontológico para que o próprio conhecimento seja possível. O que não é possível é partir de “lugar nenhum”.
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A busca pelas origens ontológicas do ser social é o principal tema da obra de Lukács. Para ele o ser não é sempre igual, na natureza encontramos alguns “tipos” de ser, que a ontologia lukatiana os classifica da seguinte forma: O primeiro é o inorgânico, não se reproduz, mas se transforma. Este ser estabelece relações entre átomos, moléculas e minerais. O segundo é o ser orgânico, com a propriedade da vida, da reprodução e do movimento (sua existência pressupõe a existência do primeiro tipo de ser para surgir). Este segundo tipo replica-se hereditariamente mas sem trazer muitas novidades.
</p>
O terceiro tipo de ser é o social (que também requer a existência dos dois primeiros para poder existir). O ser social é mais complexo que os outros dois seres e surge por último. Este ser tem uma característica específica que é a atividade finalística ou teleológica. Um tipo de atividade que do ser quando cria novas formas (ferramentas ou instrumento) para atender suas necessidades ou vontades. Essas formas ou ferramentas são pensadas e formuladas preteritamente com uma finalidade pré estabelecida. Usando seu próprio corpo e em contato com outros corpos, o ser social modifica a natureza que o rodeia e transforma a si mesmo. Essa atividade chamamos de trabalho. O trabalho é o cerne do ser social porque é necessário para o ser social existir.
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<blockquote>Uma teoria antropocêntrica da ontologia do ser social é uma teoria para uma ontologia da miséria e não nos cabe.</blockquote>
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"Ao passo que os animais agem para satisfazer suas necessidades, os seres humanos agem para produzir os eios de satisfação de suas necessidades” (MARX; ENGELS, 1993, p. 39-40)
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Marx foi um homem de sua época e certamente não conheceu o movimento animalista. Convém lembrarmos aqui que essa atividade teleológica também ocorre em diversas espécies de animais não-humanos. Com uma diferença apenas em grau e não em qualidade. Citamos por isso o Manifesto de Cambridge sobre a Consciência, publicamente proclamado em julho de 2012 naquela universidade, que declara:
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“Evidências convergentes indicam que animais não humanos têm os substratos neuroanatômicos, neuroquímicos e neurofisiológicos dos estados conscientes, justamente com capacidade de exibir comportamentos intencionais. Consequentemente, o peso da evidência indica que os humanos não são os únicos que possuem os substratos neurológicos que geram a consciência. Animais não humanos, incluindo todos os mamíferos e pássaros, e muitas outras criaturas,incluindo polvos, também possuem os substratos neurológicos.” (Low, 2012) colocado em negrito por nós
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Lembrar que os animais humanos não são os únicos seres sociais não é mero detalhe dado o caráter especista da sociedade em que ainda vivemos. Uma teoria antropocêntrica da ontologia do ser social é uma ontologia da miséria e não nos cabe. Mas não nos enrolemos, vamos para salto ontológico. De alguma forma, em alguns momentos a natureza engendra mudanças, algumas delas ou a soma de algumas delas podem transformar qualitativamente as condições de existência anteriores. Algumas teorias biológicas argumentam que a Terra em determinadas condições físico-químicas específicas foi capaz de produzir o surgimento dos primeiros metabolismos vivos. Esse é para Lukács e Lessa o salto ontológico dos inorgânicos para seres orgânicos. O segundo salto ontológico não é tão consensual para a ciência. Em uma empreitada pretensiosa e darwinista: O papel do trabalho na transformação do macaco em homem, Engels afirma ter sido a simples presença das mãos, postura ereta e consumo de carne fatores determinantes para o surgimento e desenvolvimento da atividade teleológica. Mais uma miséria ontológica. Talvez mais fatores tenham sido importantes para este salto. Como o simples acaso, ou outros fatores que ainda não fomos capazes de perceber.
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Fato é que o trabalho possui um papel central para a constituição humana, sendo a atividade que cria, inventa e modifica a natureza. Gerando uma humanização da natureza e dos próprios seres humanos. Porém este caráter do trabalho foi alterado no momento em que foi inserido em uma nova organização político-econômica, criando novas divisões e relações sociais de trabalho no mundo: o modo de produção capitalista.
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Com a implementação do modo de produção capitalista, o papel humanizador do trabalho é modificado. As condições sociais nas quais o trabalho é feito neste sistema faz com que o trabalho mude e produza efeitos diferentes dos que tinha até então. O trabalho passa a ser realizado sob novas relações sociais. Essas relações de produção na sociedade determinam as a própria sociedade que passa a ser dividida entre proprietários dos meios de produção e classe trabalhadora. Enquanto apenas a classe dominante é detentora dos meios de produção e do poder econômico para adquirir as mercadorias produzidas, a classe trabalhadora vive uma batalha eterna de vender sua força de trabalho para poder, utilizando-se dos meios de produção dos capitalistas, produzir mercadorias vendidas a um valor superior ao da força vendida, que mal conseguirá comprar o mínimo para sua subsistência.
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Aquilo que fora antes uma atividade vital consciente e humanizadora deixa de ser livre e começa a ser unicamente um meio de sobrevivência. Para a classe trabalhadora, o trabalho produtivo acaba por se transformar em uma obrigação. O trabalho não é mais feito de forma autônoma, mas na forma de trabalho alienado.
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“Ele trabalha para viver. O operário nem sequer considera o trabalho como parte de sua vida, para ele é, antes, um sacrifício de sua vida. É uma mercadoria por ele transferida a um terceiro. Por isso o produto de sua atividade não é tampouco o objetivo dessa atividade. O que o trabalhador produz para si mesmo não é a seda que tece, nem o ouro que extrai da mina, nem o palácio que constrói. O que produz para si mesmo é o salário, e a seda, o ouro e o palácio reduzem-se para ele a uma determinada quantidade de meios de vida, talvez a um casaco de algodão, umas moedas de cobre e um quarto num porão. (...) Para ele a vida começa quando terminam essas atividades, à mesa de sua casa, no banco do bar, na cama. (...)” [MARX, 1978, p.63].
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É fundamental considerarmos que essas características que o trabalho possui hoje, na análise marxiana, são frutos de um processo histórico específico que é também sujeito a mudanças. O advento do capitalismo não pode ser interpretado de forma “naturalizada” e nem como uma realidade imutável.
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O desafio que enfrentamos é o mesmo de Marx, Engels e Lukács. Cabe a nós buscar condições para construir uma nova sociabilidade na qual possamos avançar rumo a uma sociedade justa, livre das opressões e explorações (inclusive contra os animais não-humanos) que hoje estão impostas. Um novo salto ontológico se faz necessário, talvez o maior de todos.
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Héric Moura e Angelo Galdino
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Referências:<br>
LESSA, Sérgio. Para compreender a ontologia de Lukács. 4 ed., Maceió: Instituto Lukács, 2015.<br>
MARX, K. Manuscritos econômico-filosóficos. Trad. Artur Morão. Lisboa: Edições 70, 1964.<br>
MARX, K.; ENGELS, F. A ideologia alemã (Feuerbach). 9. ed. São Paulo: hucitec, 1993.<br>
LOW, P. The Cambridge Declaration on Consciousness. Francis Crick Memorial Conference on Consciousness in Human and non-Human Animals. Cambridge, UK, 2012.<br>
Engels, F. (2006). O Papel do trabalho na transformação do macaco em homem, (1876).
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